Dados do MapBiomas mostram que a área do garimpo – que em 2001 equiparava-se às áreas concedidas legalmente para a mineração no Brasil – está em expansão. Em 2021, enquanto a mineração legalizada ocupava 170 mil hectares, o garimpo, a partir de 2019, passou a superar o número da mineração legalizada, atingindo 196 mil hectares.
Estruturar soluções mais efetivas para a erradicação e contra o alastramento da cadeia de crimes originados pelo garimpo ilegal na Amazônia é atividade listada entre as prioridades do IBRAM, e várias iniciativas já foram realizadas junto a autoridades brasileiras e estrangeiras, a exemplo de Banco Central, Receita Federal, CVM, Polícia Federal, Interpol, Ministérios de Minas e Energia e Relações Exteriores, União Europeia, governo da Suíça, empresas joalheiras, Instituto Escolhas, entre outros.
O objetivo é discutir e oferecer instrumentos para erradicar o garimpo ilegal e apontar caminhos para instituição de um projeto de desenvolvimento sustentável e duradouro para a Amazônia. Entre as medidas indicadas pelo IBRAM, está impedir acesso aos mercados interno e externo de ouro; responsabilizar criminalmente intermediadores e compradores; implantar sistemas eficazes de rastreamento e de certificação de origem do minério; mudar legislação e tributação relacionadas ao ouro no País; desenvolver atividades econômicas sustentáveis e perenes na região amazônica para gerar empregos e renda, de modo a evitar a corrida do ouro ilegal.
Itamaraty e CVM: parcerias importantes
O envolvimento do Ministério de Relações Exteriores (MRE) e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no reforço ao combate à cadeia de produção e venda de ouro do garimpo ilegal foi solicitado pelo IBRAM.
Essa articulação, iniciada no 1º semestre de 2022, consiste em esforço coletivo contra o garimpo ilegal e a comercialização do ouro dessa fonte e conta com organizações da sociedade civil e órgãos de governo, tais como Banco Central (BACEN), Receita Federal, Ministério de Minas e Energia (MME), Instituto Escolhas, Instituto Socioambiental (ISA) e a própria CVM.
O IBRAM também abriu tratativas junto à Polícia Federal para avaliar a viabilidade de se estruturar um sistema de rastreabilidade de ouro e, assim, estabelecer um “DNA” para o minério produzido no Brasil. A resposta veio em março de 2023, quando a Receita Federal instituiu a obrigatoriedade das notas fiscais eletrônicas na comercialização do ouro, que até então eram em papel.
Intercessão junto a compradores
Ao Itamaraty, o IBRAM apresentou proposta solicitando intercessão junto aos governos estrangeiros, por meio das embaixadas do Brasil, com o objetivo de aprimorar os instrumentos de controle da origem do ouro brasileiro, uma vez que a União é a detentora do patrimônio mineral do País, e a produção de minérios responde pela geração de divisas fundamentais para a balança comercial.
O objetivo é que o MRE avalie ações no exterior – junto a bolsas de valores e instituições financeiras – para promover o setor como destino para a captação de recursos para operações de financiamento e de investimento no Brasil, assim como atue “junto a países compradores do ouro brasileiro, como a Suíça, que podem contribuir decisivamente para reduzir espaços dos que agem ilegalmente”, resume o diretor-presidente do IBRAM, Raul Jungmann.
Essas pautas, garante Jungmann, “geram repercussão internacional, estão relacionadas à imagem do Brasil no exterior e podem ser tratadas no âmbito do Ministério de Relações Exteriores. Seria uma estratégia de sinalizar para o Brasil e o mundo que ações concretas estão sendo conduzidas para recuperar esse importante bioma e traçar um futuro calcado em boas práticas de sustentabilidade”.
Os dirigentes do IBRAM também solicitaram ao ministro Mauro Vieira apoio do MRE junto a atores internacionais para a Exposibram 2023, realizada no Pará e com espaço para debate deste assunto. O MRE também deve agendar reunião com a representação da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), de modo a atrair a participação dos países da Bacia Amazônica à Conferência; apoiar, por meio da rede de Embaixadas e Consulados brasileiros no exterior a promoção do evento, que ocorrerá em paralelo ao maior e mais tradicional evento da mineração da América Latina, a Exposibram.
Raul Jungmann também solicitou que o ministro Vieira analise ações do corpo diplomático na prospecção de oportunidades de negócio para mineradoras do Brasil em outros países, como Argentina, Peru, Chile, países africanos, entre outros.
Atenção à lavagem de dinheiro
Para a CVM, em resposta à argumentação do IBRAM, a prioridade é intensificar ações de fiscalização das Distribuidoras de Valores Mobiliários (DTVMs) suspeitas de operações de lavagem de ouro proveniente do garimpo ilegal, garantiu seu presidente, João Pedro Barroso do Nascimento.
Reconhecendo a importância da decisão da CVM, Jungmann frisa que “a comercialização via lavagem do ouro sustenta o garimpo ilegal, atividade comandada por organizações criminosas, que desmatam e poluem a natureza, como grandes áreas da Amazônia, e assim contribuem para as mudanças climáticas; exploram pessoas, e, como operam clandestinamente, não geram divisas e nem recolhem impostos e taxas”.
De acordo com Jungmann, essas adesões ganham significado com as constatações do estudo ‘Raio-X do Ouro’, do Instituto Escolhas. O trabalho indica que, entre 2015 e 2020, o Brasil comercializou 229 toneladas de ouro com indícios de ilegalidade. Ou seja, quase a metade do ouro produzido e exportado pelo País tem origem duvidosa. O garimpo ilegal vende o ouro para DTVMs e a legislação permite que isso ocorra sem comprovação da sua origem legal.
O estudo relaciona as que compram ouro de garimpos na Amazônia; 87% de suas operações são duvidosas, o que requer uma fiscalização mais detalhada pelas autoridades. O Ministério Público Federal está à frente de ações judiciais contra algumas delas. A CVM é uma autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda e tem por finalidades básicas a normalização e o controle do mercado de valores mobiliários.
Projeto de Lei
Paralelamente a essas ações capitaneadas pelo IBRAM, em 13 de junho de 2023, o governo brasileiro enviou ao Congresso Projeto de Lei 3025/23, que deve alterar o cenário do comércio de ouro no Brasil, confirmando mudanças que já haviam sido aprovadas em outras instâncias e uma decisão no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em abril deste ano, suspendera presunção da boa-fé. Na decisão, o Ministro Gilmar Mendes deu um prazo de 90 dias para o Poder Executivo adotar um novo marco normativo para o mercado de ouro. A proposta está em tramitação na Câmara dos Deputados.