Com tradição exportadora e com plantas muitas vezes localizadas em áreas remotas e de difícil acesso, as mineradoras enfrentam desafios relacionados aos modais de transporte e à logística. Cada uma busca a solução mais econômica ou então realiza investimentos para garantir seus prazos de embarque de seus produtos.
Não importando a decisão adotada – se construção de malha e de porto próprios, se contratação de terceiros – o gargalo em infraestrutura é nacional e de um modo geral cobra-se investimentos por parte do Estado.
A base para o trabalho está no segundo volume dos estudos “Corredores Logísticos Estratégicos”, lançado em 2018, pelo Ministério dos Transportes, após mapear e diagnosticar os corredores logísticos de transportes do minério de ferro e ferro gusa, com o mapeamento de volumes, origens e destinos, fluxos, necessidades e ações direcionadas ao melhoramento do escoamento da produção.
O balanço de feito pela atual gestão do Ministério dos Transportes, ao assumir a pasta, mostrou que a maior parte da malha federal sob administração estatal estava coberta por contratos de manutenção, mas sem recursos para executar a conservação das estradas, além de diversas obras em ritmo lento ou paradas. O cenário fora agravado com a aprovação do teto de gastos, que limitava o investimento. Segundo a Confederação Nacional dos Transportes (CNT), 66% das estradas federais estavam em estado ruim ou péssimo.
De acordo com o titular da pasta, ministro Renan Filho, “por determinação do presidente Lula, estamos retomando os investimentos públicos nas nossas rodovias e ferrovias brasileiras. Também estamos aperfeiçoando nosso modelo de concessões para atrair mais investidores. As duas ações têm o mesmo objetivo: melhorar nossa infraestrutura, permitindo mais desenvolvimento, mais renda, mais emprego para todos os brasileiros”.
E alguns encaminhamentos foram viabilizados. De janeiro a julho, informações oficiais do Ministério dos Transportes mostram a retomada e a intensificação de cerca de 1 mil contratos que estavam parados ou em ritmo lento. A recomposição do orçamento pelo Governo Federal permitiu recuperar a capacidade de investimento pelo Estado. São cerca de R$ 22 bilhões para todo o Brasil.
A malha ferroviária também vem merecendo investimentos. Atualmente estão em andamento o projeto Nova Transnordestina e a construção, pela concessionária Bahia Ferrovias S.A., da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), entre Ilhéus e Caetité (Bahia). A principal carga prevista para ambos os casos é o minério de ferro.
O Governo Federal via Ministério dos Transportes, nesse período, lançou três editais de concessão à iniciativa privada de rodovias federais – lotes 1 e 2 do Sistema Rodoviário do Paraná e BR-381/MG. E tem mais dois previstos ainda em 2023: Rio-BH (BR-040/495/MG/RJ) e Rota dos Cristais (BR-040/GO/MG).
Nas ferrovias, as principais ações a mitigar o gargalo da oferta de infraestrutura, são prorrogações antecipadas, munidas de investimentos obrigatórios; destravamento do projeto “Nova Transnordestina”, relicitação da Malha Oeste e autorizações ferroviárias.
Mesmo com os gargalos existentes, o Ministério dos Transportes informa que a infraestrutura ferroviária, que atende o setor de mineração, composta por nove ferrovias, em 2022, transportou 359,3 milhões toneladas pelas ferrovias brasileiras. Contudo, algumas ferrovias têm esta produção destacada. (vide box)
Terminais portuários e transporte hidroviário
O Ministério de Portos e Aeroportos, tendo à frente da pasta Márcio França, além das iniciativas para atração de investimentos privados e implementação de investimentos públicos, “vem atuando para a redução da burocracia por meio de iniciativas como a discussão do poder público, o setor privado e os usuários pela Comissão Nacional das Autoridades nos Portos (Conaportos), que atua na revisão de processos do setor, a integração e otimização de sistemas de anuência dos órgãos públicos, bem como na discussão de revisões normativas para o aumento da eficiência portuária”.
Como exemplo das iniciativas sob gestão deste Ministério, são citados o sistema Porto Sem Papel, a implantação da Janela Única Aquaviária, o Port Comunity System, dentre outros, que contribuem para a redução dos tempos de operação, dos custos, para o provimento de novos serviços e melhoria da eficiência com o uso de novas tecnologias, o que tende a gerar benefícios para diversas cadeias de produção, como a atividade de mineração.
Especificamente a movimentação portuária dedicada aos granéis sólidos minerais brutos e seus concentrados responde por cerca de 33% do total movimentado ao ano, em todos os portos e terminais do País, cabendo ao minério de ferro a maior parcela (aproximadamente 31%). Os demais minerais que passam pelos portos são manganês, cobre, níquel, alumínio/bauxita, estanho, cromo, nióbio, tungstênio, metais preciosos e seus concentrados.
De acordo com o Anuário Estatístico da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), no último triênio, as operações de granéis sólidos minerais alcançaram 1,2 bilhão de toneladas, considerando os portos públicos e os terminais privados. Até o último mês de abril, a movimentação se encontrava na faixa de 120 milhões de toneladas.
O Ministério de Portos e Aeroportos destaca o minério de ferro como responsável por 91% do total da movimentação realizada de 2020 até 2023, o que demonstra a verticalização da cadeia logística, desde as regiões de mineração até os portos. A relevância também se verifica quando os terminais de uso privado representam amplamente a movimentação dos portos, perfazendo a proporção de 87% da movimentação total, com 1,1 bilhão de toneladas.
Os cinco terminais com as maiores movimentações estão nas regiões Nordeste e Sudeste do País. São eles: Terminal Marítimo de Ponta da Madeira (MA); Terminal de Tubarão (ES); Terminal da Ilha Guaíba (RJ); Porto do Açu, Terminal de Minério (RJ); Porto Sudeste (RJ).
Portanto, na visão da Pasta, “o País está bem servido de infraestrutura portuária para atendimento do setor de mineração. Para demonstrar o interesse do mercado no crescimento do setor para esse tipo de carga, destaca-se como projeto em desenvolvimento o Terminal Porto Sul da Bamin (BA), já autorizado pelo novo Ministério de Portos e Aeroportos, com obras em andamento e previsão para início das operações em junho de 2028. Esse terminal tem a meta de movimentar 20 milhões de toneladas de minério de ferro e seus compostos por ano. Outros projetos atualmente em análise pelo MPor poderão aumentar em pelo menos 30 milhões de toneladas de capacidade para os produtos do setor”. No entanto, para o setor de mineração, “os investimentos portuários devem ser acompanhados por investimentos ferroviários – políticas do novo Governo Federal já em andamento -, potencializando os efeitos sobre a infraestrutura e a logística de transportes”.
Entre projetos previstos e arrendamentos portuários, com destinação de movimentação e armazenagem incluindo granéis minerais, há alguns avanços e negociações em andamento. No caso de terminais, nos últimos anos foram licitadas quatro unidades: STS20 (2019), ATU12 (2020), TERSAB (2021) e SUA07 (2022), que totalizam um CAPEX de R$ 1,08 bilhão. Para os próximos anos, estão previstos leilões de 25 terminais MAC15, POA02, POA11, VDC04, REC04, REC09, REC10, VDC10, ITG03, ITG02, FNO01, POA26, REC07, PAR03, IMB12, IMB06, IQI16, MUC03, REC03, MAC16, STS53, POA08, STS41, STM01, e STM02, que, em análise preliminar, totalizam um CAPEX de aproximadamente R$ 5 bilhões.
O segmento de granéis minerais, por exemplo, que tem como predominância as regiões produtoras de Carajás (PA), e do Quadrilátero Ferrífero (MG), tem avançado para outras províncias minerais na Bahia, no Ceará e no Mato Grosso do Sul. O aumento do valor do minério de ferro tem viabilizado a exploração destas províncias minerais que demandam, além de novos portos e terminais para sua exportação, vias férreas de alta capacidade ou hidrovias de qualidade. Portanto, os granéis sólidos minerais e a sua logística de transporte são altamente dependentes da qualidade e disponibilidade da infraestrutura portuária e além dos investimentos privados já realizados e previstos.
Neste momento, o Ministério de Portos e Aeroportos discute e planeja, junto à Presidência da República, a realização de empreendimentos para ampliação, manutenção e melhoria da infraestrutura portuária, que também beneficiará as unidades portuárias que atendem as demandas do setor de mineração.
O Programa BR do Mar e o transporte hidroviário – O Ministério de Portos e Aeroportos reconhece as vantagens do modal de transporte hidroviário, como menores custos de deslocamento e grande capacidade de transporte de carga se comparado aos transportes rodoviário e ferroviário. Alega, contudo, que no Brasil, “esse transporte é usado principalmente por meio do sistema intermodal e depende muito do interesse dos transportadores de utilizarem essa opção hidroviária e do segmento privado construir as instalações portuárias e as embarcações para utilização deste modal”.
A não existência de projeto hidroviário específico ou exclusivo voltado à atividade mineradora é confirmada pelo Ministério, que cita projetos de melhorias nas hidrovias, como a execução de dragagens, derrocamentos, sinalização e balizamentos das vias navegáveis, a exemplo da dragagem de manutenção do rio Madeira (Hidrovia do Madeira); do derrocamento do Pedral do Lourenço (Hidrovia do Tocantins); da dragagem do tramo norte do rio Paraguai (Hidrovia do Paraguai); e a sinalização e balizamento do rio Paraná (Hidrovia do Paraná). São iniciativas imprescindíveis para garantir confiabilidade e perenidade na navegação. No entanto, quanto aos investimentos em ativos, o Ministério informa a existência de alternativas à aquisição de embarcações, como o arrendamento.
O Ministério agrega a esse cenário a volatilidade da disponibilidade de embarcações no mercado internacional e a variação das diárias de afretamento, que podem chegar a 400% de aumento em curto espaço de tempo, afastando os embarcadores desta opção no curto prazo, como forma de fugir dessa exposição ao risco. Assim, “em razão da exigência de fluxo perene de transporte e a necessidade de previsibilidade dos custos logísticos, os grandes embarcadores celebram contratos de arrendamento de embarcações ou afretamento de longo prazo. Esta lógica é comumente identificada no mercado internacional, como é o caso dos navios Valemax, os maiores navios mineraleiros do mundo, utilizados pela empresa Vale para a exportação de minério”.
Já com relação ao transporte marítimo de cabotagem também há exemplos de fluxos logísticos para a mineração, assegurados por navios afretados pelo tempo da vida útil da embarcação. Neste contexto, o programa denominado BR do Mar irá fomentar o desenvolvimento do transporte marítimo de cabotagem, assegurando o ambiente para realização de investimentos e acesso à frota com menor custo de capital e operacional e, assim, proporcionar aos embarcadores maior liberdade para a oferta de soluções logísticas.
Na atualidade, o Ministério de Portos e Aeroportos está realizando os ajustes finais na minuta do Decreto que regulamentará a Lei nº 14.301/ 2022, instituindo Programa BR do Mar, com as considerações colhidas junto ao setor. A previsão é que seja publicado no início do segundo semestre deste ano. Entre as diversas medidas constantes no BR do Mar, o Ministério enfatiza a instituição de novas possibilidades de afretamento de embarcações estrangeiras; de propriedade ou posse de subsidiária integral de empresa brasileira de navegação para atendimento exclusivo de contratos de transporte de longo prazo e prestação exclusiva de operações especiais de cabotagem.
A nova modalidade de afretamento para atendimento exclusivo de contratos de transporte de longo prazo permite que embarcações com bandeira estrangeira possam atender a demanda específica de um embarcador, sem afetar outras operações do mercado de cabotagem. Assim, o lastro da operação em um contrato possibilita a operação de navios estrangeiros na cabotagem, de forma perene e com menores restrições. Já as operações especiais de cabotagem têm como objetivo viabilizar que uma embarcação estrangeira possa operar na cabotagem por até 36 meses, viabilizando a estruturação de linhas regulares para o transporte de cargas em tipo, rota ou mercado ainda não existentes.
Nesta perspectiva, seria possível a utilização de embarcações estrangeiras na cabotagem, com condições mais vantajosas, para o desenvolvimento de operações logísticas ainda não exploradas.
Seguindo esta lógica, os potenciais projetos de exploração mineral destinados ao mercado nacional, identificados nas regiões Sul, Sudeste, Nordeste e, notadamente, na região Norte, serão potencializados pela maior flexibilidade para a constituição de frotas implementadas pelo Programa BR do Mar. As medidas previstas no Programa podem viabilizar projetos de depósitos minerais, considerados antieconômicos em razão do seu custo logístico.