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A atividade pela lente do Direito da Mineração

A atividade de mineração, para ser realizada, depende de autorizações regulatórias/minerária e licenciamento ambiental, etapas estas que incluem a concessão de lavra, processos administrativos de outorga, de intervenções ambientais, das licenças e outros documentos que variam, segundo a fase em que o direito se encontra. Ou seja, todo um arcabouço de leis, portarias, resoluções, dentre outros.

Os Direitos Minerários, divididos entre as fases de autorização de pesquisa, requerimento e concessão de lavra são de responsabilidade da Agência Nacional de Mineração. Já as licenças ambientais são outorgadas por órgãos distintos da Administração Pública, sendo que há induvidosa interdependência entre os procedimentos, pois concessão de licenças ambientais é pré-requisito para a concessão de lavra, assim como a titularidade dos processos minerários é sempre avaliada para fins de continuidade do procedimento de regularização ambiental.

Como explica Fábio Henrique Vieira Figueiredo – advogado especializado em Direito da Mineração, sócio-titular da Figueiredo, Werkema e Coimbra Advogados Associados – independentemente dos documentos necessários para a operação de uma jazida, “o procedimento é burocrático e envolve diversos órgãos em âmbito federal, estadual e municipal. Essa sobreposição de legislações e regulamentações leva o setor a trabalhar com horizonte médio de cinco anos para o licenciamento ambiental. Além disso, há municípios que fazem licenciamento ambiental em paralelo ao federal, exigindo compensações, a nosso ver, de forma desvirtuada”.

William Freire, advogado especializado em Direito da Mineração, reconhece que esse prazo pode estender-se, a depender da complexidade do projeto: “Para projetos médios e maiores, o prazo varia entre 10 e 20 anos, em geral”.

Com base na análise do que ocorre em alguns países que podem servir de comparação, Freire constata que “a estrutura do processo administrativo brasileiro é inadequada e burocrática.” Entendendo que, considerando a evolução da tecnologia e a experiência que já há em relação à atividade mineral, o processo administrativo pode ser aprimorado e simplificado”.

O entendimento jurídico é o de que o licenciamento ambiental “deve ser realizado por um órgão único. O ideal é organizar a legislação, que é muito esparsa, acabar com a interveniência dos municípios nos licenciamentos federais e estaduais e estabelecer prazos para manifestação dos agentes envolvidos no licenciamento ambiental”, afirma Figueiredo, citando como exemplo que há, no licenciamento, interferências até do Ministério da Saúde, quando envolve áreas endêmicas à malária; da Funai, quando há o envolvimento de terras indígenas; da Fundação Cultural Palmares, para quilombolas; e de entidades vinculadas ao patrimônio histórico e cultural em âmbito federal. Há também interferências com órgãos estaduais.

Outro aspecto apontado por Figueiredo tem relação com a necessidade do licenciamento ambiental para emissão da portaria de lavra. A seu ver, “depois de formalizado o licenciamento ambiental, com estudos técnicos e respectivos responsáveis, nada mais deveria ser exigido com relação ao licenciamento minerário para a obtenção de uma portaria de Lavra”. E reforça: “a mineração é uma atividade importante para a vida no âmbito da 4ª Revolução Industrial. Como ter aerogerador sem minério de ferro; bateria sem lítio, carro elétrico sem cobre? Interessa para o mundo que o Brasil minere e, para ser um grande ator em energia descarbonizada, deve-se ter uma política pública que agilize os processos, sem perdas de qualidade da análise e favoreça o desenvolvimento de tecnologias”.

Os entrevistados reconhecem os recentes esforços da ANM para tornar mais eficiente o processo de outorga de direitos minerários, tais como os esforços para a digitalização do processo minerário, a reorganização das competências dos órgãos internos da Agência, a revisão do arcabouço jurídico, sobretudo no âmbito da ANM (esfera infralegal), para garantir mais segurança jurídica ao processo de outorga de direitos minerários e adequar a normativa aos avanços tecnológicos da atividade minerária. Ou seja, as normas aplicáveis à atividade estão em franca evolução para garantir maior segurança jurídica ao setor mineral, principalmente devido à preocupação e à exigência de compartilhamento prévio das alterações normativas com os atores fiscalizados por parte da Agência.

Ponto delicado apontado pelos especialistas em Direito da Mineração refere-se ao Código de Mineração, base legal da mineração no Brasil, instituído pelo Decreto-Lei nº 227, de 28 de fevereiro de 1967 e alterado por legislações posteriores, no intuito de modernizar a normativa com o passar do tempo, como a Lei nº 14.514, de 29 de dezembro de 2022, que passou a permitir a oneração e o oferecimento de Direitos Minerários como garantia. No entanto, por se tratar de uma Lei da década de 1960, o Código de Mineração possui algumas disposições que podem não ser mais aplicáveis ao contexto atual, “como a disposição relacionada ao emprego de animais na mina”, cita Paula Azevedo de Castro, especialista em Direito Minerário e sócia do escritório Cescon Barrieu.

Convicto de que “o Brasil tem grande potencial mineral, o boom da mineração ainda está por vir” e “empresas organizadas encontram no Brasil geodiversidade propícia à implantação de bons projetos”, Freire entende que, como a atividade mineral foi definida pelo legislador como de utilidade pública, é de suma importância “criar política mineral de Estado, de longo prazo, aprimorar o sistema jurídico e melhorar o ambiente de negócios, atentar para a necessidade de aprimorar a segurança jurídica no sentido mais amplo possível e reduzir o custo Brasil”.

O caminho sinalizado por Freire – fundamentado em sua experiência como advogado, professor, autor de diversos livros relacionados ao Direito da Mineração, fundador do Instituto Brasileiro de Direito Minerário (IBDM), coordenador do Departamento de Direito da Mineração do Instituto dos Advogados de Minas Gerais e árbitro – envolve, por parte do Estado, “a gestão adequada dos recursos minerais, para o Brasil não correr o risco de perder sua geossoberania”. Aos investidores, orienta fazer “a gestão adequada dos riscos para preveni-los. O País é muito atrativo, considerando-se sua geodiversidade e sua experiência em lidar com grandes projetos. Portanto, é possível implantar empreendimentos minerários no País com segurança”.

As fases do processo minerário e a legislação correspondente

Para o processo minerário, as variáveis são distintas conforme a fase em que o direito se encontra. Assim, como detalha Paula Castro, quando da fase de pesquisa, as variáveis seriam a avaliação das áreas prioritárias ou das áreas de Unidades de Conservação e Terras Indígenas, para identificação de terrenos em que não se poderia promover a pesquisa mineral; e o plano de trabalho com respectivo orçamento para a desenvolvimento das atividades essenciais à identificação de uma jazida.

A partir da pesquisa feita, a atenção volta-se aos resultados obtidos, à coordenação de informações para a identificação de uma riqueza geológica ou comprovação de existência de uma jazida e à economicidade conceitual de seu aproveitamento. “Sob a perspectiva ambiental, para esta fase, considerando que as pesquisas minerais normalmente não exigem licenciamentos por não provocarem impactos significativos ou irreversíveis, as variáveis primordiais são identificação de áreas ambientalmente protegidas, a fim de avaliar a necessidade de prévias autorizações que poderiam impedir a realização dos trabalhos, ou a análise dos impactos sobre a flora e também sobre a hídrica, se necessária”, informa a especialista do Cescon Barrieu, destacando que “caso estejamos diante da pretensão de extração experimental por meio de guia de utilização, as preocupações ambientais serão as mesmas de uma lavra, que será abordado mais à frente”.

Para a fase de concessão de lavra, de modo geral, a ANM avalia o potencial geológico da área objeto do Direito Minerário e as operações constantes do plano de lavra a ser executado no local, notadamente a locação das estruturas e a pujança de produção, assim como a economicidade projetada da operação de lavra, ou seja, a quase garantia de um fluxo positivo, mesmo ante a possível flutuação de preço das commodities minerárias. “A existência de um capital inicial ou condições via ativos imobilizados e equipamentos para fazer frente a esta operação, considerando o fluxo de caixa projetado ao longo do tempo, também é objeto de análise por parte da Agência, embora normalmente não seja uma questão relevante para fins de indeferimento do pleito”.

Por outro lado, para a outorga da licença ambiental, “o órgão licenciador avalia o potencial poluidor, bem como o cumprimento do regramento ambiental e das condicionantes aplicáveis às fases de concepção, instalação e operação do empreendimento ou da atividade”, alerta Paula Castro, ao informar que “atualmente, a garantia de segurança dos equipamentos e estruturas utilizadas na mineração tem sido também um ponto nevrálgico para se prosseguir com projetos de mineração”.

Os aspectos levados em consideração por ocasião da viabilidade ambiental relacionam-se diretamente às principais temáticas da mineração: supressão de vegetação e garantia de conservação de área proporcional; impacto nas águas, principalmente no caso de lançamento de efluentes ou rebaixamento do nível d’água; proteção do patrimônio espeleológico; e impactos às comunidades locais. Como esclarece a especialista do Cescon Barrieu, esses pontos, embora preocupações mais relevantes, não eliminam “outras temáticas quanto a solo, fauna, patrimônio cultural, dispersão atmosférica e outros podendo ser mais ou menos relevantes a partir de empreendimento específicos”.